Com a instrução normativa, pulicada na última sexta-feira (29/8), que impõe às fintechs as mesmas obrigações dos grandes bancos, essas empresas passam a compartilhar saldos e movimentações com a Receita Federal. A medida garante maior credibilidade ao setor, mas, ao mesmo tempo, traz mais tarefas para o dia a dia. Startups nascentes de soluções financeiras terão de lidar com novas demandas e desafios.
Se por um lado, isso representa maiores custos na hora de abrir uma empresa, por outro torna o mercado mais seguro e preparado para investidores.
- Desenvolvimento ou adaptação de sistemas para coletar, armazenar e transmitir dados transacionais segundo os padrões exigidos pelo Fisco;
- Governança de dados robusta, com normas claras sobre classificação de operações, tratamento de dados sensíveis e segurança da informação;
- Contratação de profissionais especializados em compliance (KYC/AML), capazes de identificar e reportar operações suspeitas conforme previsto;
- Processo de onboarding mais burocrático, alinhado às exigências de identificação e justificativa do cliente — o que aumenta o custo de aquisição e o operacional, especialmente no início.
“O desembolso necessário para se estruturar vai além do registro formal, envolve infraestrutura, processos e pessoal capacitado. A conta pode ficar pesada”, esclarece o advogado empresarial e tributarista David Andrade Silva. “Os custos vão depender da solução e do segmento de atuação”, complementa Guilherme Chernicharo, sócio da Hiker Ventures, fundo de venture capital da AF Invest.
Uma das startups investidas pela Hiker Ventures, por exemplo já havia adotado medidas de regulação para aumentar sua credibilidade antes da nova instrução normativa. O custo de implantação de sistemas, somado a despesas jurídicas para regulamentação e assessoria junto ao Banco Central, chegou a R$ 4 milhões. Os valores que precisarão ser desembolsados para cumprir a nova norma ainda não foram estimados.
Os especialistas dizem que é possível recorrer a ajuda terceirizada, de acordo com o orçamento do empreendedor. Contratar advogados é uma opção inicial para compreender a regulação financeira e cumprir a e-Financeira com segurança. Também é possível delegar a parte técnica, com plataformas BaaS (Banking as a Service) que já têm infraestrutura pronta para envio da e-Financeira, oferecendo o chamado compliance as a service.
Outra alternativa é conduzir essas etapas de forma independente, após participar de workshops ou trocar experiências com a comunidade. “É possível consultar associações e entidades de representação, como a Febraban e a ABFintechs, que costumam organizar seminários, webinars e publicações sobre temas relacionados ao setor”, sugere o advogado David Andrade Silva.
Por outro lado, Chernicharo acredita que a regulamentação pode ser vista como uma oportunidade de diferenciação. “É fundamental se distinguir de instituições clandestinas que usam o nome ‘fintech’ para fins ilícitos. A regulamentação busca reduzir dúvidas sobre a integridade das operações e fortalecer os mecanismos de controle e fiscalização”, aponta. Assim, o momento também é propício para entrar em um mercado que está amadurecendo e ganhando credibilidade, o que pode ser positivo para quem tem condições de investir os valores necessários no setor.
Diego Perez, presidente da Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs), vê o cenário geral como positivo, mesmo com os desafios e a necessidade futura de investimentos. "É verdade que será necessário investir em segurança, compliance e inovação, mas esses pontos fortalecem o ecossistema, aumentam a confiança dos consumidores e abrem portas para soluções mais sólidas e escaláveis", diz.
Para associação, o empreendedor vai encontrar um cenário competitivo, porém mais preparado para parcerias e inovação. "Acreditamos que ainda há um vasto espaço para fintechs que tragam soluções especializadas, focadas em nichos e nas necessidades reais dos consumidores e empresas brasileiras", complementa o presidente.
Doug Storf, diretor da Associação Brasileira de Banking as a Service, também acredita que os desafios podem se transformar em oportunidade, já que um compliance bem aplicado resulta em diferencial competitivo. "Talvez o mais difícil seja criar produtos que realmente se destaquem em um mercado já muito competitivo, com milhares de fintechs disputando atenção e relevância. Abrir uma fintech hoje demanda não apenas capital financeiro, mas também capital humano, tecnológico e institucional sólidos", opina o diretor.
Fonte: Pequenas Empresas & Grandes Negócios